domingo, julho 12, 2009

SOMOS REFÉNS PORÉM, CÚMPLICES

O vocábulo refém poderá levar você, amigo/a leitor/a, a imaginar que lerá algo sobre sequestro ou coisa equivalente e que esteja tipificado no Código Penal.

Entretanto, apesar de ser atípico nem por isso deixa de ser importante e merecer nossa atenção. Sempre que tenho a oportunidade de viajar procuro fazê-la, prioritariamente, de avião. E, inevitavelmente faz-se mister pousar em diversos aeroportos, principalmente o de Brasília, São Paulo e Rio de Janeiro para as entediantes escalas e/ou conexões. Aí se intensificam os problemas. Digo intensificam porque além dos desgastes e estresses com as companhias aéreas por atrasarem seus vôos vemo-nos reféns dos preços abusivos praticados, sobretudo pelas lanchonetes, cafeterias, pipoqueiros e congêneres. As demais lojas oferecem produtos que para os menos consumistas vêem-nos como opcionais mas quanto às guloseimas intensificaremos nossas observações.

Você já se deu conta, amigo/a leitor/a, o quão exorbitante é o preço de uma garrafinha “nanina” (330ml) de água? Paguei nada menos que R$ 2,50. Um garrafão de 20lt custa R$ 5,74 e uma garrafa de 1,5lt custa R$ 1,89 no supermercado. Quando mostrei espanto pelo valor da mesma a atendente se adiantou em dizer, muito despreocupadamente, que em qualquer loja do aeroporto era aquele o valor cobrado.

Minha filha insistiu para que eu comprasse um saquinho de pipocas. Para não desapontá-la, pois estava febril, tive que desembolsar R$ 3,00 pelo mesmo.

Como o vôo que eu aguardava atrasou, tive que permanecer mais tempo do que o previsto (e do que gostaria!) no aeroporto. Nosso relógio biológico logo acusou fome, “hora de lanchar” e para uma famosa rede de franchising nos dirigimos. Quase enfartei ao pagar R$ 3,00 por uma xicarazinha de café com leite. Nossa! isso me fez refletir sobre a pouca importância que dou ao precioso café com leite minha casa.

De outra vez, me atrevi a saborear duas bolas de sorvete pagando o equivalente a um pote de 1,8lts dessas marcas melhores que são vendidas em supermercado.

Lamentavelmente, não existe nos arredores dos aeroportos opções de lojas e serviços para que tenhamos direito à escolha. Não é assim que acontece nas paradas de ônibus que fazem linhas de grande distância? Se não gostamos do cardápio e do preço, temos a liberdade de atravessar o asfalto (geralmente é assim) e compramos o produto do concorrente que às vezes tem mais opções do que aquelas oferecidas pelas paradas oficias e o que é melhor, com direito a pechinchar pois dá certo em 90% dos casos. Você já experimentou pechinchar em aeroportos? Surtiu algum efeito? Aposto que não. Parece que tudo é tabelado (lembra o tempo dos planos cruzeiro e cruzado!).

Não pense o/a leitor/a que estou saudosista de andar de ônibus, pelo contrário, perde-se muito tempo nas estradas (aliás, que estradas?). Estou dando ênfase à diversidade de concorrentes. Afinal, desde pequenos aprendemos que “a concorrência é a alma do negócio”. Pelo visto esse jargão já se tornou obsoleto. Veja nos aeroportos, mesmo sem ela os donos desses estabelecimentos têm faturado muito, creio que para eles não há crise (parece a ilha utópica de Thomas More, nada ameaça a estabilidade de seus residentes e eles são felizes!).

Por que cobram tão caro? A quem compete fiscalizar preços tão abusivos? Que tipo de regulamentação tem os proprietários desses estabelecimentos que não contempla controlar tamanha carestia? A quem reclamar? Como você pode observar, amigo/a leitor/a, estou tentando com todas essas indagações deixar de ser refém conivente, cúmplice.

Ai que saudades que tenho do tempo em que as companhias aéreas serviam os acepipes na sala de embarque. Você se lembra ou vivenciou este momento amigo/a leitor/a? você poderá dizer que naquele tempo poucas pessoas podiam viajar de avião. É possível, mas fazia bem desfrutarmos de um serviço de bordo de cardápio variado e apetitoso. Havia café da manhã, almoço e jantar com talheres de inox! Até manta de frio, travesseirinhos eram oferecidos aos passageiros. Quanta saudade!

E hoje amigo/a leitor/a o que é servido nas aeronaves? Cookies, sanduíche (já tive um desarranjo intestinal por conta de um desses) e muito, mas muito refrigerante além claro de, esporadicamente, servirem um kit com duas bolachas, um queijinho e uma geleiazinha. Tão fraquinho!

Imagine você que um dos trechos que voamos às 6:40 da madruga não havia a opção café com leite e a garçonete de bordo (é o que elas realmente são não é?) repetiu em tom firme e nada amistoso que “só havia refrigerantes e suco de laranja senhora!”.

Entendo perfeitamente que para driblarem crises sucessivas era preciso baratear preço de passagens aéreas e reduzir custos. Apesar de não ser graduada em Matemática, poderíamos fazer uso de uma regra de três simples: redução no valor das passagens equivale a aumento de passageiros e, consequentemente, obtêm-se mais lucro. Uma fatia desse lucro bem que poderia ser revertido em benefício dos clientes.

Que lógica é essa que quanto mais lucra menos investe na qualidade dos serviços prestados? Fala-se tanto em “fidelização do cliente” e ironicamente quando em vôo ouvimos frase célebre reiteradas vezes que diz mais ou menos assim: “sabemos que a opção é de livre escolha do cliente, obrigada por escolher X companhia”. Êpa, mas tem trechos que não nos cabe outra escolha, aí estamos duplamente reféns. Tem que haver uma reengenharia nisso tudo, ou mais antigo ainda aplicar o 5 S (quem não se lembra?) nas companhias aéreas.

Há tempos que venho refletindo sobre tudo isso mas quando volto para casa das viagens feitas novamente me vejo assoberbada com tantas atividades, apesar de indignada, o distanciamento desse registro de ocorrência vai-se esmaecendo e só se intensifica de novo quando é necessário voar.

Mas hoje foi diferente, durante o vôo de volta à Imperatriz (1h45min) tive a felicidade de ter ao alcance de minhas mãos um caderninho de minha filha com caneta e assim compartilhar com você amigo/a leitor/a tamanhas inquietações para que não continuemos calados, submissos, reféns, cúmplices!

Boa viagem!


Este artigo foi publicado no Jornal O Progresso, no dia 12/07/2009.

Nenhum comentário:

Postar um comentário