domingo, novembro 01, 2009

A MORTE É O FIM?

Estamos prestes a homenagear aqueles que nos antecederam no retorno à pátria espiritual, na data em que se convencionou chamar de ‘Dia de Finados’, ocasião na qual fazemos visita aos cemitérios da cidade, já que a reverência acontece na necrópole.

Mas, em conformidade com a crença que professamos, acreditamos em destinos diferentes para o espírito de nossos mortos. Sobre tais crenças faremos algumas reflexões.

Curiosamente, fazemos poucas reflexões acerca do inexorável fenômeno chamado morte. Será que nossas ocupações diárias nos impedem de fazê-las? Será que a tememos tanto a ponto de nem sequer pensarmos na hipótese (infalível) da morte? Ou será que esse é um assunto típico, apenas daqueles que estão na terceira idade, também conhecidos por “pés-na-cova”?

Muitos creem que o espírito dormirá até o dia do Julgamento. Há aqueles que afirmam que tudo acaba com a morte, portanto não há expectativa alguma pós-morte. Outros acreditam que, dependendo do modo como viveram na Terra, para o bem ou para o mal, seu espírito irá para o céu, para o inferno ou purgatório. Há outros que acreditam que a morte é a continuidade da vida, ou seja, nada, nem ninguém, morre; o que realmente acontece é uma mudança de estado. E você, amigo leitor, com qual dessas asserções se identificaria? Analisemos cada uma.

Deus, Criador ou Arquiteto do Universo, trabalha incessantemente pela ordem e harmonia de sua criação; se assim o é, porque permitiria o sono, o ócio para suas criaturas.? Façamos uma comparação com nossos pais terrenos. Após intensas batalhas diárias, dão-se por satisfeitos ao verem os filhos crescidos, criados, formados e estabilizados. Os filhos, a maioria, desejam retribuir o investimento e dedicação recebidos, então, submetem-se ao trabalho, não apenas para sua subsistência, mas também para agraciar os genitores com uma melhor qualidade de vida, não é assim? Bem, seguindo esse raciocínio, os mais novos trabalham para que os mais velhos (experientes) descansem. Com esse singelo exemplo afirmo ser inconcebível o contrário, ou seja, Deus trabalhar e nós descansarmos. Em Sua criação nada há de estático; aprendemos isso com a Ciência, com Lavoisier que afirma estar tudo em permanente transformação, não apenas a matéria visível aos olhos, mas também aquela quintessenciada.

Se o nada pós-morte existisse, qual o motivo de vivermos, de sermos bons, virtuosos, íntegros, honestos enfim, cristãos? Nessa linha de raciocínio, não haveria contravenção às leis de Deus os atos do suicídio, homicídio, infanticídio, genocídio, corrupção, pedofilia, eutanásia, aborto, preconceito, afinal tanto faz ser bom ou mal, pois o nada nos esperaria; nem prêmio nem castigo.

Bem, àquela terceira asserção seria necessário indagar: os que forem para o purgatório e para o inferno viverão lá ad eternum? E os que estiverem no céu estarão no ócio, na contemplação cósmica, na reflexão? Aprendemos que a ‘estrutura’ do inferno é feita de fogo, muito fogo para queimar os pecadores. É possível queimar o espírito desprovido de corpo, aquele um dia sepultado no cemitério que visitamos no Dia de finados? O gelo queima tanto quanto o fogo. Se assim é, porque não imaginamos um inferno feito de gelo? Mas que diferença faz ser fogo ou gelo, se não há mais o corpo que sofre as intempéries do frio ou calor?

Quando nossos filhos erram, nós os castigamos para sempre ou lhes damos chances para que aprendam com os erros e não tornem a repeti-los? Afinal, nós pomos os filhos no mundo para cuidarmos deles, encaminhá-los, educá-los, amá-los ou, para perdê-los? Se nós, que somos imperfeitos, agimos com a melhor das intenções para com nossas crias por quê Deus, inteligência Suprema e Causa primeira de todas as coisas, não teria paciência com a lentidão do processo de aperfeiçoamento de suas criaturas? Por que imaginamos um Pai ‘tolerância-zero’, ao invés de um Pai amoroso e bom? Não é estranho imaginá-Lo assim tão impaciente, intolerante como muitas vezes nós somos?

O céu povoado de ociosos deve ser na verdade um inferno. Se nós diariamente trabalhamos, estudamos, cuidamos da casa, do jardim, dos bichinhos de estimação, vamos ao cinema, ao teatro, à igreja, visitamos amigos, evangelizamos, temos todos esses afazeres que põem à prova nossas múltiplas capacidades para crescermos no convívio com os pares, para nos instruirmos, para sermos ‘gente’, então, todo esse lufa-lufa é próprio da vida terrena, porque no céu, tudo é desacelerado, não há com o que se preocupar, é viver de oração todo o tempo e até, brincar de modelar nuvens? Ai, que tédio esse modelo de céu, você não acha amigo leitor?

A quarta asserção, com a qual me identifico, diz que todos nós estamos em contínuo aperfeiçoamento e que devemos fazer muito bom uso do livre-arbítrio que nos foi concedido, para que não nos arrependamos de nossos erros. Mas, se, na pior das hipóteses, relutarmos em seguir os ensinamentos de Cristo teremos, sim, de trabalhar em dobro para, em conformidade com o conhecimento de que dispúnhamos das leis de causa e efeito, reparar o mal feito ou a omissão diante do bem que se poderia fazer. Nunca é tarde para buscarmos a felicidade, seja aqui, na condição de encarnados seja lá, na condição de finados, digo, desencarnados.

Deus nos ama tanto e torce pelo nosso sucesso nessa senda evolutiva, que Ele não descarta a possibilidade de retorno a este planeta, ou a outros, tudo com a finalidade de nos fazer progredir, crescermos, amadurecermos espiritualmente. Ele jamais deixaria uma só de suas ovelhas se perderem, afinal Deus é Onipotente.

O mundo espiritual é extremamente dinâmico, se comparado ao céu anteriormente retratado. Mudamos de endereço e de matéria, mas não perdemos nossa individualidade. Os afazeres continuam em pátrias que se assemelham a esta, mas tudo é bem mais organizado, melhor administrado. Nossas conquistas intelectuais, afetivas e solidárias representam nosso patrimônio cósmico e, diga-se, são inalienáveis, imperecíveis e intransferíveis.

O lugarzinho para onde vamos na pátria espiritual depende primeiramente de nós. Não é a igreja que salva, não. O que ‘salva’ são as boas ações em favor do próximo, são os esforços que dispendemos no combate contra nossas más tendências que serão melhor elucidadas no uso diário da meditação e da prece. Não basta estarmos na igreja; é preciso que ela esteja em nós onde, ou com quem quer estejamos. Ser bom para quem é bom conosco, para os nossos confrades é fácil demais. Difícil, porém meritório, é ser bom para aqueles que sabemos nos quererem mal, que nos perseguem e caluniam. Sendo assim, sejamos bons não apenas objetivando a recompensa, mas para fazermos brilhar a luz que Deus nos confiou, por acreditar que nós, Seus filhos, não morremos, nem padecemos eternamente.


Este artigo foi publicado no Jornal O Progresso, no dia 01/11/2009.

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